30.5.12

broken wings


Morro de vontade de te ter aqui.
Deixaste-me afogar nas lágrimas, por mim derramadas, no final de uma primavera sem cor. Roubate-me a alma, mas nem por isso a dor que a faz contorcer-se desesperadamente; nem por isso a escuridão que a controla.
Os desejos de frio, de morte, os pesadelos e pensamentos tão sombrios como as próprias sombras, o medo, o alívio, o tudo e o nada, tu e eu, o sol e a lua, Roubaste-me a vida - não que a preservasse - e remeteste-me à existência, à torturosa dor de uma rotina indesejada.
Nunca me poderei culpar o suficiente por te ter quebrado as asas. Por te ter impedido de, com as tuas penas brilhantes e douradas como mel, relíquia semelhante à doçura da voz que outrora me prometera a eternidade, levantares voo e rasgares o céu com a minha presença em ti. Voltar a ser parte de ti, oh, que sonho louco e irreal. Mas não passa disso, um sonho, porque agora a tua ambição é correr, com as asas magoadas debaixo do braço. Correr sem fim, sem uma palavra de despedida, sem destino, sem lágrimas, sem arrependimentos. Correr para esse mundo no qual sempre desejaste viver e esperar até que as tuas asas partidas regenerem.
Interrogo-me se serás realmente feliz nessa tua outra realidade, sem quem um dia juraste ser a própria vida para ti.


27.5.12

o sabor da depressão

Prometi ao meu frágil coração despedaçado não tocar com a tinta gasta da caneta neste assunto, mas a sede de palavras obrigaram-me a depositar os meus sentimentos na minha, tão antiga, paixão.



Como uma esponja negra encharcada de sangue, espremeste o orgão, que sempre bateu por ti, como quem tira a vida a uma criança indefesa. Cada som por ti proferido pairou no ar, repetiu-se mil e uma vezes e deixou o eco a orbitar a minha mente.
O meu rosto, mais pálido do que mármore, deixa-se queimar pelas lágrimas que me escorrem na face. Sinto a pele desfazer-se e deixar transparecer quem realmente sou. Quem sempre fui e tentei esconder atrás de mil e um sorrisos, no medo a que este meu "eu" se revelasse no brilho do meu olhar. 
Enrolada no meu próprio corpo desprezível, sinto as palavras fluirem, arranhando as paredes do meu coração e arracando a pele de meu peito. As palavras doces e escorregadias como caramelo derretido, que me aqueciam o corpo da cabeça aos pés, transformaram-se em pregos negros e afiados, escuros e frios, que se espetam no peito com força, certeiros, e lá ficam a penetrar a minha carne. Toda eu sou dor e trevas, escuridão, morte. Toda eu estou envolvida numa aura negra como a noite, nem por isso minimamente bela, que me seca as células e extorce delas toda a vida. Não, não toda, tem o cuidado de deixar alguma para que continue a sofrer, para que a dor continue a torturar-me. Pior que doze meses sem sentir os olhos fecharem-se em descanso, pior que doze anos sem sentir o paladar de um alimento, pior que doze décadas sem uma gota do líquido transparente pelo qual matam e morrem . Pior que tudo o que alguma vez tive o desprazer de sentir, e já senti muita coisa.
Sozinha na imensidão do nada, devastada por memórias e ilusões, continuo à espera do que nunca acontecerá.

13.5.12

que deus?


Criaturas perdidas, patéticas e miseráveis, procuram uma razão para a sua dispensável existência e choram as mágoas de quem não se importa. Procuram lógica, procuram motivo, e como a vida é nada mais do que um conjunto de coincidências com interligações não especificadas e, bem, estúpidas, procuram o que tanto necessitam no inexplicável. No que não pode ser contrariado por não poder ser afirmado. No invisível, no impercétivel, no inexistente, ou não?
É amor, é raiva, é paz e guerra, é o gelo e o fogo, é o tudo e o nada. 
Criado por meros mortais, escrito por meros mortais, adorado por meros mortais. Por meros mortais nascido e por meros mortais morto, talvez, um dia, quem sabe? Mas por agora vive nos corações de, na sua maioria, ignorantes criaturas que crêm no que lhes foi dito para crer, vêm o que lhes foi dito para ver e sentem o que lhes foi dito para sentir. Ensinadas a pensar por uma linha estreita e reta, é-lhes impossível não lhes passa sequer pela mente - conservada como uma rosa constituída apenas por pétalas num invólucro de cristal - desviar-se do caminho de tijolos azuis e brancos, atirar-se de cabeça para um outro caminho, cair noutra hipótese ou facto depois de incontáveis cambalhotas.
Não, não, porque a sociedade sem escrúpulos e maleada de forma a não questionar os valores inevitáveis a que é submetida.
Questionar, questionar, questionar. Faço-o e continuarei a fazê-lo enquanto este mundo não me decidir dele expulsar.


12.5.12

lost inside myself


Caminho apressada por um caminho escuro e estreito enquanto o terrificante Mundo das Sombras me tenta sugar para uma distinta realidade, no entanto, tão próxima. 
Arrasto, com as forças que ainda não me abandonaram (ao contrário de todos os que um dia me prometeram a eternidade) o manto por mim costurado, com a seda das ilusões, o algodão do desespero e a lã - sabem, aquela lã que nos pica a pele, mas nos aquece o corpo? - dos vícios, cozido com uma agulha fina de ponta redonda e fio de açúcar em pó.
Arrasto o peso que carrego com a repulsa que sinto a fazê-lo escorregar das minhas costas. Uma nuvem cobre-me o corpo em que fui presa injustamente.
Eu não pedi este sofrimento constante nem este coração maltratado. Não pedi ser um feto no colo de uma mulher que nunca me quis. Não pedi ser a rapariga que todos odeiam incluindo ela mesma, não pedi nenhuma das cicatrizes no meu corpo enfraquecido. Não, eu não pedi ter nascido. Agora só uma coisa peço e só uma coisa quero, só há uma coisa que busco, o fim, talvez o início, o nada.
Arrasto-me por um mundo que não é o meu e lágrimas cortam-me o rosto. Mais afiadas do que as minhas próprias lágrimas, atormentam-me e aprisionam-me no ser desprezível que sou e nunca deixarei de ser.
E ao chegar ao fim, ao precipício porque tanto lutei, ao fosso sem fundo, ao poço escuro no qual expulsarei do meu organismo o último suspiro de vida... Quando chegar ao fim... Interrogar-me-ei porque razão a idiotice das pessoas é tão acentuada que chegam a inquirir-me se pensaria duas vezes.

6.5.12

metades

 
Um toque suave,
Uma forma de vida,
Movimentos viciantes,
Almas à deriva.
Diferenças cativantes,
Olhares maliciosos,
Abraços amorosos,
Beijos escaldantes.

Um doce arco de inúmeros sentimentos,
Duas almas carregadas de incontáveis pensamentos,
Partilhados à lareira, à luz do luar,
Tão leves como o vento vemo-los flutuar.

Somos uma alma,
Um pedaço de ser.
Algo que não quiseram,
Ou algo que não quisémos ver 

Somos um barco à deriva separado num oceano vazio,
Somos um poema escrito que vive num coração frio,
Somos uma música cantada por quem não sabia a letra,
Uma doce melodia, uma suave tentação,
Que se divide em mil pétalas no espaço, na imensidão.