26.11.12

deixa-me

 
Encontro-me mergulhada na exaustão do fim de tarde. A chuva de novembro (sim, como na música) chicoteia as janelas lá fora. Dói-me a cabeça, muito. E tenho algo a fazer. Tenho de desenhar, estudar, tocar. Mas ao invés disso deito-me na cama sem fazer nada, com uma mente vazia, ou quase. Estás lá tu. De novo, como sempre, atormentas-me o pensamento, com que direito? Sim, que direito tens tu de fazer algo como isto, deixares-me mas continuares em mim, tão vivo como dantes, a contorceres-te no meu coração?
O corpo de uma rapariga repousa, imóvel, numa cama branca e rosa. Vejo o corpo; vejo-o através dos seus olhos. As mãos claras, os pés frios, as pernas magras. Vejo-o mas não o sinto, não há sangue a correr-me nas veias, não há calor nem frio. Não o mexo, perdi o controle sobre ele, este corpo que não é meu. Que faço aqui? Tenho medo, estou perdida. Estarei morta? Existo? Serei só uma ilusão aprisionada numa bola de vidro? 
Vejo-te, voltas a mim, com uma nitidez sobrenatural que me magoa o ámago, e esta passa a ser a única dor que sinto. Voltam a mim os teus olhos e sorriso, os beijos ao fim da tarde, filmes no frio da noite e bolachas acabadas de fazer. Voltas a mim e não me deixas viver, não me deixas amar, sinto-me a cair outra vez.
Quero lutar, quero-me de volta, mas não posso. Perdi-me sem ter para onde ir e deixei-me levar pela dor.
E desta vez, ninguém me pode salvar.

21.11.12

segunda carta que te escrevo


Sinto a tua falta quando não estás, quando não te sinto comigo. Quando me abandona aquela sensação calorosa de ter alguém, ou quase, alguém para que sou uma pétala em vez de um espinho como sempre fui tratada. Estás no orvalho frio destas manhãs de Novembro, nos vidros embaciados do autocarro cheio, na almofada em que acordo, nos bocejos e olhos lacrimejantes daqueles a quem o sono ainda não abandonou. Estás comigo, mas não em mim; seguro-te pela mão, ou és tu que me seguras? És meu? É cedo, eu sei; demasiado, demasiado cedo para me entregar, mas porque não? Fazes tudo parecer tão fácil.
Quero ver-te, quero sentir-te comigo outra vez, quero ter-te perto. Quero que me sorrias e quero ouvir as tuas gargalhadas, ter o teu toque mesmo que por poucos segundos, quero assegurar-me que és real, que isto não é apenas um sonho das noites inacabáveis, quero sentir-me como me fazes sentir, quero provar felicidade de novo, o nervosismo que me invade quando caminhas para mim, e sinto-me derreter, a cair, cada vez mais, neste poço sem fundo.
E quando penso que o feitiço me abandonou, ou não passou de ilusão, aproximas-te devagar e apertas-me contra ti, como tanto me vejo imaginar, como tanto me vejo querer, as tuas mãos nas minhas costas e os teus lábios contra a minha pele, não me magoes, temos tempo, vamos tentar?

18.11.12

primeira carta que te escrevo


Tens o poder de fazer as minhas pernas latejar quando o teu olhar encontra o meu. Aqueces-me o coração como chocolate quente num dia de Inverno, e é bom. É confortante, apazigua-me a alma e tranquiliza o pensamento. Os teus braços em meu redor deixam-me estática com emoção, o corpo que quero abraçar, sentir-me protegida outra vez, começar de novo. 
Estás tão perto e eu afasto-me, com medo de me magoar, de te magoar, tu que és tão frágil, não aguentaria ver-te sofrer. Segura-me junto a ti, perto, mais perto, os teus lábios quase nos meus, tua respiração no meu rosto e fiquemos assim, sem mais nada, trocas de olhares e sem pronunciar uma palavra, porque não há nada que os olhos não digam.
Um arrepio invade-me cada centímetro do corpo quando pronuncias o meu nome, e deixo-me derreter nas tuas palavras doces, caramelo e baunilha numa dança improvisada, o teu toque nas minhas mãos e as bochechas coradas, as covinhas amorosas e a barba por fazer, consigo recordar cada uma das tuas feições com nitidez, porque a tua imagem ficou gravada na minha mente desde o primeiro dia em que vi, imagem que deixa saudade quando te vais, imagem que me enfeitiça, porque me escolheste? Tenho medo, é demasiada felicidade, não ma tires, não ma tirem. Deixa-me tê-la, e ter-te também, mas com calma, temos tempo. Vamos caminhando devagar, os dedos entrelaçados ao de leve, uma canção de amor, quero ter calma, cuidado, tento não cair, não aguentaria a queda.
Oh, mas tropecei logo que me sorriste.

1.11.12

adeus


Admite, sentes a minha falta. Estás só, falta-te um pedaço de coração, a peça que antes encaixava em teu corpo na perfeição perdeu-se - sabes onde ela está, mas não a podes apanhar. Sentes frio e ninguém te aquece, o sofá onde passámos tardes sem fim estendidos parece de súbito demasiado largo. Os teus braço encontram-se em volta de uma almofada fria, no lugar onde antes presenciava um corpo. Tens saudades de nós mas não coragem: não tens mais condições de sofrer. Sei disso, sei como te sentes, porque sinto o mesmo. Penso em ti. Acho que, desde aquele dia, nunca deixei de te ter no pensamento. A tua foto, meia torta, um retrato antigo de nós repousa nas paredes da minha mente, e não sai. Ouço a tua voz, sinto o teu cheiro, mas foste-te. Já não voltas, e se voltasses? Aceitar-te-ia de volta? Sim. Numa batida de coração, num piscar de olhos, mas não posso. 
Por isso, não voltes. Deixa-te estar na paz da solidão, vai passar. O tempo tudo arrasta, menos as memórias. Essas ficam, meu anjo, essas não largo, nunca.
Espero que encontres o que procuras.